Imóvel dado em garantia de dívida perde atributo de impenhorabilidade

09/12/2022

Por Camilla Imthon Cavalcanti de Albuquerque

Processos que visam a recuperação de créditos costumam envolver diversas questões que tangenciam a busca por ativos do devedor. Veja-se o exemplo de um caso patrocinado pelo Teixeira Fortes, em que o Judiciário enfrentou os seguintes temas:

(1º) em garantia de operações de antecipação de recebíveis, foram oferecidos imóveis de terceiros que não houveram assumido nenhuma obrigação pessoal (não foram avalistas, por exemplo); o contrato de alienação fiduciária, no entanto, não chegou a ser registrado na matrícula imobiliária, por descumprimento de exigências cartorárias; a mera assinatura do contrato de garantia gerou, para o credor, o direito de penhorar os imóveis?

(2º) imóvel comercial tem a proteção da lei do bem de família?

(3º) o oferecimento de imóvel em garantia fiduciária descaracteriza a proteção ao bem de família?

Vencemos as três questões!

A prestação de garantias por terceiros é perfeitamente legal. A fiança locatícia é um exemplo. No caso concreto, o Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDC) patrocinado pelo Teixeira Fortes concedeu linha de crédito para operações de antecipação de recebíveis a uma determinada empresa. A garantia foi prestada por terceiros, que não assumiram, pessoalmente, nenhuma solidariedade pela dívida, mas tão somente ofereceram o imóvel em garantia.

O detalhe, no entanto, é que a alienação fiduciária não chegou a ser registrada na matrícula imobiliária devido a exigências cartorárias não cumpridas pelos garantidores. Ou seja, ao credor não havia a possibilidade de excutir o bem mediante leilão, na forma prevista na Lei nº 9.514/1997. [1]

Com a inadimplência, o credor ingressou com ação de execução e indicou à penhora os imóveis oferecidos por terceiros. Daí a pergunta: poderia um imóvel de terceiro, que não figura no polo passivo da ação, ser penhorado? A resposta está no artigo 835, §3º, do Código de Processo Civil, que serviu de fundamento para o deferimento do pedido:

“§ 3º Na execução de crédito com garantia real, a penhora recairá sobre a coisa dada em garantia, e, se a coisa pertencer a terceiro garantidor, este também será intimado da penhora.”

Os devedores, então, tentaram cancelar a penhora com base na proteção ao bem de família, prevista na Lei nº 8.009/90.

A diligente equipe de Recuperação de Créditos do Teixeira Fortes demonstrou, no entanto, que:

(a) o imóvel era destinado a fins comerciais, inclusive mediante imagens do Google Street View e outras provas produzidas;

(b) a regra de impenhorabilidade do bem de família, ademais, não pode ser aproveitada por quem, espontaneamente, oferta o imóvel em garantia de dívida, conforme assunto já tratado em artigo da advogada Mayara Mendes de Carvalho, a respeito das operações de home equity.

Assim decidiu a 14ª Câmara do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, em feito relatado pelo eminente Desembargador Thiago de Siqueira:

“(…) Não caberia mais ao Agravante (“devedor”) alegar a impenhorabilidade desde imóvel, por cuidar-se de bem de família, por contrariar o princípio da boa-fé objetiva, que deve ser resguardado em todos os contratos, gerando obrigações entre as partes antes, durante e depois da contratação. Pode ser aplicado no caso, por analogia, a exceção prevista quanto ao imóvel dado em garantia hipotecária, nos termos do art. 3º da Lei nº 8.009/90, segundo qual: “A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:(…) V – para execução de hipoteca sobre imóvel, oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar”
Note-se, ademais, que o §3º do art. 835 do novo Código de Processo Civil, assim estabelece: Art. 835 – A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:(…) §3º Na execução de crédito com garantia real, a penhora recairá sobre a coisa dada em garantia, e, se a coisa pertencer a terceiro garantidor, este também será intimado da penhora.
Desse modo, não se há de admitir que o emitente fiduciante, que ofertou expressamente o imóvel em garantia da dívida, venha invocar este benefício legal em seu favor.”

Os credores precisam estar muito atentos às manobras dos devedores. No caso em questão, a ausência de registro da alienação fiduciária poderia ter desestimulado o credor, por acreditar que não teria o direito de prosseguir com a penhora sobre o bem. Igualmente, o desconhecimento a respeito das hipóteses de aplicação da proteção ao bem de família seria capaz de gerar a perda de ativos penhoráveis, mas a experiência e a combatividade da equipe de Recuperação de Créditos do Teixeira Fortes proporcionaram a manutenção da penhora e, consequentemente, o recebimento do crédito.

 

[1] Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.

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