Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou a validade da notificação enviada por e-mail ao devedor fiduciante, para fins de constituição em mora. Basta que o endereço de e-mail esteja previamente indicado no contrato, e seja comprovado o efetivo recebimento da comunicação.
Proferida no âmbito do Agravo em Recurso Especial nº 2477497/DF, a decisão reforça e consolida uma interpretação atualizada do § 2º, do artigo 2º, do Decreto-Lei nº 911/1969, que afasta a obrigatoriedade da utilização exclusiva da carta registrada com aviso de recebimento como mecanismo para a notificação, sendo igualmente admissíveis meios eletrônicos que ofereçam equivalente segurança e rastreabilidade:
“Art. 2º
[…]
§ 2º A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário.”
A controvérsia teve origem em ação de busca e apreensão de veículo, ajuizada por instituição financeira em face do inadimplemento contratual por parte do devedor fiduciante, no âmbito de um instrumento particular garantido por alienação fiduciária entre as partes. Com o intuito de constituição em mora, e para exercer os direitos decorrentes da condição de credora fiduciária, a instituição financeira procedeu ao envio de notificação extrajudicial ao endereço eletrônico certificado e previamente indicado pelo devedor fiduciante no próprio contrato.
O devedor fiduciante, ao impugnar a liminar de busca e apreensão concedida em primeiro grau, sustentou a invalidade da notificação extrajudicial realizada por e-mail, ao alegar que o envio não se deu por carta registrada com aviso de recebimento. Apontou, ainda, a ausência de comprovação de efetivo recebimento, o que, em sua visão, afastaria a equivalência jurídica entre a notificação eletrônica e a correspondência física tradicional.
No julgamento do agravo de instrumento interposto, a Corte de origem manteve a decisão que deferiu a liminar de busca e apreensão, reconhecendo a validade da notificação eletrônica, com base nos seguintes fundamentos:
(a) Interpretação do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 911/1969. A norma não exige exclusivamente a utilização da carta registrada com aviso de recebimento para o ato da notificação, mas apenas faculta seu uso, como se extrai do termo “poderá”. O envio da notificação ao endereço do devedor fiduciante indicado no contrato é suficiente para a constituição da mora.
(b) Idoneidade jurídica do e-mail certificado. Por permitir a comprovação do remetente, do destinatário, da data, do horário e do conteúdo, o e-mail registrado é reconhecido como meio legítimo de notificação extrajudicial, sobretudo quando sua entrega e conteúdo são certificados por cartório.
(c) Previsão contratual expressa quanto à comunicação eletrônica. A Cláusula 11 da Cédula de Crédito Bancário firmada entre as partes dispunha de forma expressa sobre a autorização do devedor fiduciante para o envio de comunicações por meios eletrônicos, incluindo e-mail, SMS e telefone. Tal disposição reforça a legitimidade do e-mail como canal oficial para notificações, sobretudo quando utilizado o endereço previamente informado pelo próprio devedor fiduciante e constante dos cadastros da instituição credora.
Foi destacada, ainda, a importância da autonomia privada na definição dos meios de comunicação contratualmente pactuados, bem como a aderência dessa prática à modernização dos instrumentos contratuais e à realidade tecnológica atual.
(d) Adequação à legislação e jurisprudência sobre atos processuais digitais. A decisão faz referência à Resolução CNJ nº 354/2020, a qual regulamenta atos processuais digitais, e à Lei nº 14.195/2021, que passou a considerar o endereço eletrônico como meio preferencial de citação. Tais normas refletem a tendência de modernização das comunicações no âmbito jurídico.
Quanto ao julgamento do recurso especial, com enfoque na correta aplicação da legislação federal, o STJ atestou que a notificação por e-mail é válida nas hipóteses em que houver previsão contratual e comprovação formal do recebimento da comunicação.
A jurisprudência do Tribunal Superior sinaliza, de forma clara, que os meios eletrônicos são juridicamente válidos e eficazes, desde que respeitados os requisitos de transparência contratual e comprovação formal da comunicação, assegurando os direitos do credor. A prevenção contratual bem estruturada pode ser decisiva para a viabilidade, segurança e tempestividade da execução da garantia fiduciária, especialmente em contextos que demandem resposta rápida e juridicamente robusta.
Dessa forma, a inclusão de cláusulas contratuais prevendo expressamente o uso de meios eletrônicos de comunicação — como e-mail e WhatsApp —, associada a mecanismos de certificação e comprovação do envio e recebimento, representa uma medida estratégica no contexto das garantias fiduciárias, fortalecendo a confiabilidade do procedimento, reduzindo fricções processuais e viabilizando medidas de recuperação mais eficazes. A relevância dessa prática se acentua em operações estruturadas com elevado grau de recorrência, que exigem procedimentos padronizados, céleres e juridicamente seguros para uma efetiva constituição em mora e subsequente execução da garantia.
01 julho, 2025
20 junho, 2025
12 junho, 2025
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