Código de Defesa do Consumidor não incide nos contratos de compra e venda com alienação fiduciária em garantia

28/10/2022

Por Camila Almeida Gilbertoni

Em 2021, o Superior Tribunal de Justiça afetou os Recursos Especiais nº 1.891.498 e 1.894.504 ao rito repetitivo, para decidir a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à hipótese de rescisão de contrato de compra e venda de bem imóvel com cláusula de alienação fiduciária em garantia.

Um dos recursos afetados (1.891.498) tratava do seguinte caso:

(a) houve venda a prazo com alienação fiduciária do próprio imóvel em garantia do pagamento das parcelas;

(b) o comprador inadimpliu as parcelas e o imóvel foi leiloado na forma da Lei Federal n° 9.514, de 20 de novembro de 1997;

(c) não houve arrematação nos dois leilões;

(d) seguindo o disposto na Lei n° 9.514, o imóvel retornou ao patrimônio da credora, a dívida foi considerada extinta e nenhum valor foi devolvido aos compradores;

(e) o Tribunal de Justiça de São Paulo, em decisão de segunda instância, entendeu que a venda do imóvel tinha natureza jurídica de compromisso de compra, acusou a alienante de burlar o direito dos adquirentes de desfazer o negócio e condenou aquela a devolver 90% das parcelas pagas.

O TJSP fundamentou a decisão no artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor:

“Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado”.

O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, reformou a decisão do TJSP para validar o contrato e o procedimento adotado pela incorporadora, mediante a fixação da seguinte tese:

Tema 1.095. “Em contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária devidamente registrado, a resolução do pacto, na hipótese de inadimplemento do devedor, devidamente constituído em mora, deverá observar a forma prevista na Lei nº 9.514/97, por se tratar de legislação específica, afastando-se, por conseguinte, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor”.

De acordo com a Lei n° 9.514, que trata sobre a alienação fiduciária de bem imóvel em garantia, a inadimplência das parcelas gera ao credor o direito de cobrar o devedor mediante notificação extrajudicial. Não purgada a mora, o imóvel será submetido a dois leilões, o primeiro com preço mínimo de arrematação correspondente à avaliação do imóvel e, o segundo, com valor mínimo equivalente à dívida atualizada.

Em não havendo arrematantes, o credor torna-se o proprietário pleno do imóvel, garantindo-lhe a lei o direito de ingressar com ação de reintegração de posse com pedido liminar para a desocupação em 60 dias.

No caso analisado pelo STJ, não houve lances nos leilões e o imóvel retornou à propriedade da incorporadora.

A tese firmada pelo STJ segue a mesma linha de entendimento adotado pela 1ª Câmara de Direito Privado do TJSP, em processo em que o Teixeira Fortes atuou, no qual esta Corte decidiu que o artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor não se aplicava aos contratos de compra e venda de bem imóvel com alienação fiduciária em garantia, conforme trecho destacado abaixo:

“Em princípio assiste razão à agravante quando se insurge contra a resolução do contrato, pois no caso sub judice houve contrato de compra e venda do imóvel com alienação fiduciária, o que afasta a possibilidade de resolução com fundamento no art. 53 do Código de Defesa do Consumidor.

A Lei nº 9.514/97, que instituiu a alienação fiduciária de imóvel, contém regulamentação própria a respeito da extinção do contrato em caso de inadimplemento, procedimento que deve ser observado e afasta a construção jurisprudencial a respeito da liquidação do contrato a pedido do adquirente para apuração dos valores a serem restituídos na forma do art. 53 do Código de Defesa do Consumidor.” [1]

A tese firmada pelo STJ vai ao encontro da decisão já obtida pelo Teixeira Fortes e, em nosso entendimento, regulará de forma definitiva o procedimento a ser adotado em caso de inadimplemento do comprador de bem imóvel com cláusula de alienação fiduciária em garantia.

 

[1] TJSP. Agravo de Instrumento nº 2226129-92.2021.8.26.0000. 1ª Câmara de Direito Privado. Rel. Des. Enéas Costa Garcia. Data do julgamento: 31/01/2022.

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