Demissões em massa colocam em evidência a proteção trabalhista dos bancários

14/10/2025

Por Eduardo Galvão Rosado e Emanuelle de Moraes Mastrogiacomo

Conheça os direitos garantidos por lei – da jornada reduzida às indenizações por metas abusivas – e veja os resultados conquistados pelo Teixeira Fortes em favor da categoria.

 

I – Introdução

No último mês, ganhou destaque na mídia a notícia de que uma das maiores instituições bancárias do país promoveu a demissão em massa de mais de mil trabalhadores. Episódios como esse trazem à tona não apenas a insegurança profissional de quem atua no setor, mas também a importância de se conhecer os direitos específicos dos bancários, cuja rotina diferenciada e peculiaridades da função são reguladas de forma especial pela legislação trabalhista.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu art. 224, prevê jornada reduzida justamente para os bancários, em razão da intensidade e peculiaridade de suas funções. Entretanto, não raras vezes os bancos buscam contornar essa regra, enquadrando empregados como se exercessem cargos de confiança, sem que estejam presentes os requisitos legais. É nesse ponto que a Justiça do Trabalho tem desempenhado papel fundamental para a reparação dos direitos suprimidos.

II – Enquadramento do bancário

A legislação brasileira considera bancário todo empregado de instituições financeiras e correlatas que exerçam atividades típicas da intermediação bancária. Esse enquadramento garante o acesso a um regime especial de proteção, entre eles a jornada reduzida.

III – Jornada Reduzida e Cargo de Confiança

Entre os direitos mais relevantes, destaca-se a jornada especial: o bancário comum tem direito a trabalhar, no máximo, 6 (seis) horas por dia, totalizando 30 (trinta) horas semanais. Apenas quando efetivamente investido em cargo de confiança, com poderes de mando, gestão e autonomia decisória, o empregado pode se sujeitar a 8 horas diárias.

Ocorre que, na prática, é recorrente a tentativa de enquadrar trabalhadores comuns como “cargos de confiança”, para mascarar jornadas superiores e reduzir custos o que, evidentemente, não pode ser tolerado.

A título elucidativo, dentre as inúmeras vitórias nos processos patrocinados pelo Teixeira Fortes, salienta-se uma recente em que o Tribunal Regional do Trabalho afastou a tese de cargo de confiança e determinou o pagamento das 7ª e 8ª horas como extras, reconhecendo que as funções exercidas eram meramente administrativas e sem autonomia. Neste caso, a condenação ultrapassou R$ 2 milhões, assegurando ao trabalhador valores devidos por anos de labor além da jornada legal. Vejamos trechos da citada decisão:

“(…) O autor fazia apenas conferência para verificação de conformidade com os normativos do banco, sem qualquer cunho decisório ou que pudesse denotar autonomia para algum procedimento. (…) Até para trabalhar além da 8ª hora o autor precisava de autorização da preposta. O autor desempenhava função administrativa, e, ainda segundo a preposta, “o autor realiza o cadastro das informações, mas apenas realiza a conferência; que caso o autor aponte desconformidade, o processo é reencaminhado à agência para adequação, sem possibilidade de continuação sem a devida correção”. De tudo concluo que o rte. era bancário comum, sem fidúcia especial ou superior à generalidade da categoria, enquadrável no caput do art. 224 da CLT e sujeito portanto ao cumprimento de jornada de 6 horas diárias. A comissão percebida remunera apenas a maior responsabilidade do cargo, não guardando nenhuma vinculação com o cargo de confiança tipificado no § 2º do mesmo artigo. (…)”

IV – Gratificação de Função e a Não Compensação

Importante esclarecer também que o simples pagamento de gratificação não basta para caracterizar cargo de confiança: trata-se de mera remuneração adicional pelo trabalho já executado, sem efeito de compensação com horas extras.

Esse entendimento foi reforçado em outro processo conduzido pelo escritório Teixeira Fortes, que resultou em condenação de mais de R$ 900 mil contra o banco. Vejamos:

“(…) Saliente-se, por oportuno, que o simples pagamento da gratificação de função não é suficiente para caracterizar o exercício do cargo de confiança, sendo necessário que o exercente de tal cargo possua um mínimo de poderes dentro do organograma funcional, hipótese que não se verificou no presente feito. Evidente que a gratificação é mera remuneração ao trabalhador pelo horário normal executado, inexistindo direito a ré efetuar a compensação com as horas extras. Aplica-se o entendimento consubstanciado na Súmula 109 do C. TST, no sentido de que: “O bancário não enquadrado no § 2º, do art. 224, da CLT, que receba gratificação de função, não pode ter o salário relativo a horas extraordinárias compensado com o valor daquela vantagem (…)”

O verdadeiro cargo de confiança exige a comprovação de confiança especial, traduzida em atribuições como poder de mando sobre subordinados, autonomia sobre a jornada, autorização para assinatura de documentos relevantes e, ainda, remuneração diferenciada por gratificação superior. Apenas nesses casos a lei afasta a limitação da jornada de seis horas.

Ressalte-se: mesmo o pagamento de gratificação superior a um terço não gera, por si só, presunção de exercício de cargo de confiança. Ainda, neste sentido, foi o entendimento firmado em outro processo patrocinado pelo Teixeira Fortes, no qual o Tribunal afastou a alegação de cargo de confiança e reconheceu o direito às horas extras do reclamante:

“(…) Tal gratificação nos faz concluir que se trata apenas de artifício para justificar o enquadramento de confiança para afastar a jornada típica bancária. Ainda que assim não fosse, o fato de receber gratificação superior a um terço da remuneração não gera presunção do exercício do cargo de confiança; afinal a caracterização da fidúcia não depende, necessariamente, do pagamento de gratificação. Reforço o argumento de que para o enquadramento da chamada “confiança bancária” é necessária a comprovação de que o empregado efetivamente exercia função revestida de especial fidúcia, ou seja, aquela que extrapola a básica, inerente a qualquer bancária, independentemente de norma expressa pela normativa interna do Banco ou por eventual adesão a determinado programa remuneratório diferenciado com pagamento de adicional intitulado de “confiança”. Ademais, não se trata de escolha da jornada de 8h, mas de enquadramento em cargo de confiança de forma incorreta, apenas para validar a jornada adotada pela ré, a despeito daquela estabelecida em lei, portanto, inaplicável a OJ 70 do C. TST.”

V – Danos morais decorrentes da jornada e condições de trabalho

Além das horas extras, os bancários podem ter direito à reparação por danos morais em situações em que o ambiente de trabalho seja comprovadamente nocivo.

Isso ocorre, por exemplo, quando há cobrança excessiva de metas, sobrecarga de trabalho e prática reiterada de horas extras, ocasionando adoecimento psicológico comprovado por perícia médica.

Em outra demanda patrocinada pelo Teixeira Fortes, o Juízo reconheceu o direito de uma bancária, que exercia funções de atendimento a clientes, à indenização por danos morais no valor de R$ 80.000,00, diante da prova pericial que atestou a existência de transtornos psiquiátricos relacionados às condições de trabalho:

“(…) Relata a reclamante que em razão das condições de trabalho e do ambiente estressante, em razão da cobrança de metas e prática de horas extras, acarretou transtorno psiquiátrico, com acompanhamento médico e afastamentos previdenciários, razão pela qual requer o pagamento da indenização por danos morais. (…) Portanto, concluo que restou comprovado que a doença psiquiátrica que acometeu a reclamante teve como concausa o trabalho, como esposado pela prova pericial. E, uma vez que restou constatada a concausa média, ou seja, o ambiente de trabalho atuou de forma intensa na doença que acomete a autora, concluo que faz jus a reclamante à indenização perseguida. (…)”

VI – Conclusão

A legislação brasileira assegura aos bancários direitos especiais justamente para equilibrar a exigência da função com a proteção da saúde e da dignidade do trabalhador. A prática de mascarar cargos de confiança para ampliar a jornada não é pontual, mas recorrente, e a Justiça tem reiteradamente reconhecido o abuso e garantido reparações significativas.

A experiência do Teixeira Fortes em diversas ações demonstra que é possível reverter enquadramentos indevidos, recuperar horas extras trabalhadas e até obter indenizações por danos morais decorrentes de práticas abusivas.

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