11/04/2025
As instituições financeiras que atuam no financiamento ao setor da construção civil precisam estar especialmente atentas às fragilidades que podem comprometer a efetividade das garantias hipotecárias oferecidas em operações com construtoras. Uma recente decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça expôs com clareza os riscos envolvidos quando a estrutura jurídica da garantia não acompanha as transformações patrimoniais que ocorrem ao longo do tempo.
No caso julgado, um terceiro ofereceu um terreno como garantia hipotecária em favor de um contrato de crédito celebrado entre uma instituição financeira e uma construtora. No entanto, após formalizar a hipoteca, esse mesmo garantidor celebrou contrato de permuta com a construtora, transferindo o terreno e recebendo, em troca, unidades autônomas do empreendimento que viria a ser erguido naquele local. Diante do inadimplemento da construtora, o banco buscou a satisfação do crédito via execução judicial, mantendo o antigo proprietário do terreno – o garantidor hipotecário – no polo passivo da ação, mesmo ele já não sendo mais titular do bem gravado.
Esse julgamento evidencia uma questão de grande importância para as instituições que operam com financiamentos no setor da construção civil: a necessidade de atenção redobrada quanto à estruturação e descrição das garantias reais oferecidas em tais operações. A prática de garantir contratos com imóveis de terceiros é comum, especialmente em operações de crédito voltadas para o desenvolvimento imobiliário. Contudo, este caso reforça que a hipoteca é uma garantia real, com efeitos limitados ao bem específico gravado. Se esse bem é posteriormente objeto de permuta, alienação ou substituição — e principalmente se há baixa da hipoteca —, a garantia pode se esvaziar, e o credor corre o risco de perder a possibilidade de execução efetiva contra o garantidor hipotecário.
Inicialmente, o Tribunal de Justiça de Sergipe reconheceu a legitimidade do garantidor, ainda que o bem hipotecado já não integrasse mais o seu patrimônio. Contudo, o entendimento foi reformado pelo Superior Tribunal de Justiça. O ministro Moura Ribeiro, relator do recurso, destacou que a responsabilidade do garantidor hipotecário é estritamente real, vinculando-se ao bem dado em garantia, e não à pessoa do garantidor. Como o terreno já havia sido transferido por permuta, as unidades recebidas não estavam mais hipotecadas, em razão de decisão transitada em julgado em outra demanda processual, e o garantidor não havia assumido obrigação pessoal no contrato, sua responsabilização não se sustentava juridicamente.
Esse julgamento traz um importante alerta para as instituições financeiras. A hipoteca, como garantia real, tem sua eficácia limitada ao bem específico que a ela se submete. Se esse bem for alienado, transformado, permutado ou tiver a hipoteca judicialmente baixada, a garantia poderá se extinguir sem que o crédito tenha sido quitado. Não se trata, portanto, de um respaldo absoluto que se estende automaticamente a outros bens do garantidor. Na ausência de cláusula contratual expressa que imponha obrigação pessoal ao terceiro, ele não poderá ser responsabilizado com outros ativos patrimoniais, tampouco mantido como parte legítima em uma execução, se o imóvel garantidor já não lhe pertence.
A lição que se extrai desse precedente é clara: é imprescindível que financiadores incorporem ao seu processo de concessão de crédito imobiliário práticas de mitigação de risco que considerem não apenas a robustez da garantia inicial, mas também sua continuidade ao longo do tempo. Isso inclui a adoção de cláusulas contratuais que prevejam substituição formal de garantias em casos de permuta ou transformação do imóvel, a vinculação da hipoteca às futuras unidades do empreendimento e o monitoramento constante dos registros públicos relativos ao bem gravado.
Quando o imóvel dado em garantia sofre alterações substanciais sem que haja atualização da hipoteca ou da estrutura contratual, o banco pode perder a segurança jurídica da operação, com severos impactos na viabilidade da cobrança. A decisão do STJ evidencia que a falta de vigilância sobre essas dinâmicas pode gerar prejuízos significativos, transformando uma garantia aparentemente sólida em um risco oculto. Portanto, o olhar jurídico estratégico e o acompanhamento contínuo são indispensáveis para preservar a efetividade das garantias reais em contratos com construtoras e manter a integridade das operações de crédito nesse setor.
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