Qual é o atual panorama das contribuições para os sindicatos? Do que se trata a assistencial analisada pelo STF?

26/01/2024

Por Eduardo Galvão Rosado

De início, é oportuno esclarecer que a única contribuição que era obrigatória em favor do sindicato e tinha natureza tributária era a chamada contribuição sindical. Todavia, a partir da reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) esse cenário foi modificado, notadamente pela alteração dos artigos 578 e 582 da CLT, vejamos:

“As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de contribuição sindical, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, desde que prévia e expressamente autorizadas”. (g/n).

 

“Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de março de cada ano a contribuição sindical dos empregados que autorizaram prévia e expressamente o seu recolhimento aos respectivos sindicatos”. (g/n)

Com a nova legislação, o desconto e o recolhimento da contribuição sindical – antes compulsórios – passaram a exigir a anuência prévia do trabalhador para serem efetivados o que, automaticamente, gerou uma queda brusca de arrecadação para os sindicatos. Muito deles, inclusive, tiveram uma queda de até 90% [1].

Diante desta situação, estas entidades por se sentirem prejudicadas passaram a questionar a constitucionalidade deste ponto da reforma trabalhista, sob a principal alegação de que houve desrespeito à manutenção da estrutura sindical brasileira formada não só pelos sindicatos como, também, pelas federações, confederações e centrais sindicais.

Esse debate – extremamente acalorado – chegou ao STF que, em 29/06/2018, pôs uma “pá de cal” no assunto ao declarar constitucionais as normas legais que extinguiram a obrigatoriedade da contribuição sindical. A questão foi analisada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5794, em outras 18 ADIs (também ajuizadas contra as novas regras) e, também, na Ação Declaratória de constitucionalidade (ADC) 55 que, de forma diversa, buscava o reconhecimento da validade das mudanças na legislação.

Com isso, pelo menos no que tange a contribuição sindical, a questão foi finalmente pacificada e seguida na íntegra pela jurisprudência dos tribunais trabalhistas. A título de exemplo, vide alguns julgados:

“CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA. CONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 DA CLT. A partir da Reforma Trabalhista, as contribuições sindicais devem ser prévia e expressamente autorizadas pelos empregados, empregadores e profissionais liberais em suas respectivas categorias. A alteração legislativa não importa reconhecer a extinção da contribuição sindical, propriamente, mas sim na extinção da obrigatoriedade de seu recolhimento, exceto quando expressamente autorizado pelo empregado, a exemplo do que ocorre com as contribuições confederativa, assistencial ou taxa de reversão. Cumpre destacar que a Constituição Federal, art. 8º, IV, prevê o imposto sindical, no entanto remete sua regulamentação à lei, de forma que não há falar em inconstitucionalidade do dispositivo ao prever o recolhimento de forma facultativa. O Supremo Tribunal Federal já decidiu, na ADI 5794, declarando constitucional a nova redação dada aos artigos 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que condiciona o recolhimento da contribuição sindical à expressa autorização dos trabalhadores. A nova regra para a cobrança de contribuição sindical, tal qual expressa na CLT, é clara: é necessário autorização prévia, por escrito, do empregado. Não basta previsão em norma coletiva firmada entre os entes sindicais das categorias, é necessária a autorização expressa do trabalhador para que o desconto a título de contribuição sindical possa ser efetuado. Recurso ordinário do Sindicato ao qual se nega provimento”. (TRT-9 – ROT: 00003867220225090684, Data de Julgamento: 08/05/2023, 6ª Turma, Data de Publicação: 11/05/2023). (g/n)

 

“Contribuições sindicais patronais. Alterações da Lei 13.467/2017. A nova redação do artigo 587 da CLT autoriza ao integrante da categoria econômica a liberdade de concordar ou não com o desconto a título de contribuição sindical, o que está em consonância com o artigo 5º, inciso XX e 8º, inciso V, da Constituição Federal, que asseguram a liberdade de associação e de sindicalização, sem nenhuma restrição, ao empregador. A contribuição sindical perdeu, portanto, a partir da vigência da Lei 13.467/2017, sua natureza de tributo, de recolhimento obrigatório, conforme decidido pelo E. STF no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5794. A súmula vinculante 40 do C. STF, a orientação jurisprudencial 17 da Seção de Dissídios Coletivos do E. TST, bem assim seu precedente normativo 119, ainda que editados antes da lei 13.467/17, também se aplicam, a partir de sua vigência, à contribuição sindical patronal. Não havendo prévia e expressa anuência pela empresa representada, o desconto é indevido. Recurso ordinário do Sindicato-réu não provido neste aspecto”. (TRT-2 10006811920215020039 SP, 8ª Turma – Cadeira 2, Data de Publicação: 09/02/2022) (g/n).

 

Ocorre que, além da contribuição sindical, existem outras contribuições que, igualmente, podem ser instituídas pelos sindicatos, conforme preconiza o artigo 513, alínea “e”, da CLT:

“Art. 513. São prerrogativas dos sindicatos:

 

(…)

 

e) impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas”. (g/n).

Mas estas outras contribuições podem ser impostas pelas entidades sindicais? Os trabalhadores são obrigados a recolher?

Antes de responder as indagações acima é oportuno destacar que as “outras” contribuições que podem ser instituídas pelos sindicatos são, basicamente, as seguintes:

(i) assistencial: contribuição fixada em cláusula de convenção ou acordo coletivo (ou fixada por meio de sentença normativa) para recompor as despesas decorrentes do processo de negociação;

(ii) confederativa: fixada pela assembleia geral e que visa o custeio do sistema confederativo de representação; e

(iii) mensalidade sindical: prevista pelo estatuto de cada entidade sindical e que tem característica de contribuição voluntário em favor do sindicato.

Feito estes esclarecimentos salienta-se que, ao contrário da contribuição sindical, estas contribuições sempre foram facultativas, mesmo antes da reforma trabalhista. A questão, inclusive, já era pacificada pelo TST por meio do Precedente Normativo 119, cuja última redação é de 25/08/2014. Vejamos:

“A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados.” (g/n).

No mesmo sentido, também já era a Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC, também do TST:

“CONTRIBUIÇÕES PARA ENTIDADES SINDICAIS. INCONSTITUCIONALIDADE DE SUA EXTENSÃO A NÃO ASSOCIADOS. As cláusulas coletivas que estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical, a qualquer título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, são ofensivas ao direito de livre associação e sindicalização, constitucionalmente assegurado, e, portanto, nulas, sendo passíveis de devolução, por via própria, os respectivos valores eventualmente descontados” (g/n).

Por esta razão, em relação as outras contribuições mencionadas acima, a jurisprudência sempre foi firme em declarar a sua facultatividade. Nesse sentido, vide abaixo alguns julgados que demonstram justamente esta situação:

“CONTRIBUIÇÕES ASSISTENCIAIS OU CONFEDERATIVAS PATRONAIS. COBRANÇA INDEVIDA. Demonstra-se inconstitucional e, portanto, inválida a extensão automática da cobrança de contribuições assistenciais ou confederativas às empresas não sindicalizadas, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC do E. Tribunal Superior do Trabalho, do Precedente Normativo nº 119 do E. Tribunal Superior do Trabalho e da Súmula Vinculante nº 40 do E. Supremo Tribunal Federal, aplicáveis ao caso por analogia. No caso, evidencia-se a invalidade da cobrança em questão, relativa à contribuição assistencial e à contribuição confederativa patronais. (TRT-2 10004460520205020066 SP, Relator: RODRIGO GARCIA SCHWARZ, 2ª Turma – Cadeira 4, Data de Publicação: 13/01/2021)” (g/n)

 

“DEVOLUÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL. Consoante ditado pela r. Sentença, não há qualquer autorização por parte do reclamante para os descontos efetuados em seu salário. As contribuições, assistencial e/ou confederativa, apenas podem ser descontadas dos filiados ao sindicato, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da liberdade de associação. Nesse sentido são a Súmula 666 do STF e o Precedente Normativo 119 da SDC do TST. Assim sendo, mantenho a sentença que determinou o reembolso dos descontos salariais realizados sob o título de contribuição assistencial e confederativa. Não há como se estender a exigência de descontos a título de contribuição assistencial, ou mesmo confederativa aos empregados não filiados ao Sindicato, eis que não obstante a autorização em assembleia geral, a cobrança é ofensiva a liberdade de associação e de sindicalização (arts. 5º, XX e 8º, V da CF/88). Não havendo prova nos autos de que o reclamante seja filiado ao sindicato, mantenho a sentença. Nego Provimento. (TRT-2 10014162620195020038 SP, Relator: IVANI CONTINI BRAMANTE, 4ª Turma – Cadeira 5, Data de Publicação: 18/11/2020) (g/n).

Ocorre que, recentemente, o STF alterou o entendimento que envolve a questão e julgou constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletivos, de contribuições assistenciais para todos os empregados de uma categoria, ainda que não sejam sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição. Vejamos:

“Embargos de declaração em processo paradigma da sistemática da repercussão geral. 2. Direito do Trabalho. Tema 935. 3. Alegação de omissão, contradição ou obscuridade. 4. Efeitos infringentes. Admissão da cobrança da contribuição assistencial prevista no art. 513 da Consolidação das Leis do Trabalho, inclusive aos não filiados ao sistema sindical, assegurado ao trabalhador o direito de oposição. 5. A constitucionalidade das contribuições assistenciais, respeitado o direito de oposição, faculta a trabalhadores e sindicatos instrumento capaz de, ao mesmo tempo, recompor a autonomia financeira do sistema sindical e concretizar o direito à representação sindical sem ferir a liberdade de associação dos trabalhadores. 6. Embargos de declaração conhecidos e providos em parte para retificar a tese da repercussão geral, que passa a ter a seguinte redação: “É constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletivos, de contribuições assistenciais a serem impostas a todos os empregados da categoria, ainda que não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição.” (STF – ARE: 1018459 PR, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 12/09/2023, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 27-10-2023 PUBLIC 30-10-2023) (g/n).

Esse novo entendimento altera a decisão proferida no Agravo no Recurso Extraordinário (ARE) 1018459, com repercussão geral reconhecida (Tema 935) que, na ocasião, havia julgado inconstitucional a cobrança da contribuição a trabalhadores não filiados a sindicatos.

Mas qual é o verdadeiro impacto dessa decisão do STF para os trabalhadores?

Ao contrário do que vem sendo propagado, não houve a instituição de nova contribuição (chamada assistencial) em substituição a antiga contribuição sindical que, inclusive, tinha regras próprias (com o desconto de um dia de salário por ano de cada empregado) e era compulsória.

O que foi alterado foi a possiblidade de as entidades sindicais cobrarem – até daqueles não sindicalizados – a contribuição assistencial (que, conforme já exposto, visa recompor as despesas decorrentes do processo de negociação) desde que, entretanto, seja garantido o direito a oposição.

Assim, o atual panorama envolvendo as contribuições dos empregados em favor dos sindicatos (inclusive da tão propagada contribuição assistencial) é o seguinte:

(i) as contribuições em favor dos sindicatos para os não filiados continuam sendo facultativas;

(ii) a cobrança da contribuição assistencial – antes permitida apenas para os sindicalizados – agora pode ser direcionada a todos os trabalhadores, desde que seja garantido o direito de oposição;

(iii) se o trabalhador – não filiado – não exercer o seu direito de oposição (de acordo com as regras fixadas pela Convenção ou pelo Acordo Coletivo), ficará obrigado a contribuir em favor do sindicato; e

(iv) o direito de oposição não pode ser obstado pelo sindicato, inclusive, com a inserção de exigências e de condições impossíveis de serem cumpridas.

 

[1] Informação extraída do seguinte link: https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2019/03/05/sindicatos-perdem-90-da-contribuicao-sindical-no-1-ano-da-reforma-trabalhista.htm.

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