Novação de dívida trabalhista na RJ não protege os devedores solidários

07/07/2023

Por Thiago Albertin Gutierre

Embora a recuperação judicial (RJ) seja um importante instrumento para a preservação de negócios e a proteção de empregos, permitindo a reorganização financeira de empresas em dificuldades e a renegociação de dívidas, é necessário considerar que a novação da dívida trabalhista na RJ pode resultar em uma redução significativa dos créditos alimentares perseguidos na Justiça do Trabalho.

Isso ocorre porque é comum a aplicação de deságios que podem chegar a mais de 50% sobre os créditos trabalhistas após a aprovação do Plano de Recuperação Judicial. Esse cenário vem sendo confirmado, inclusive, pelo Superior Tribunal de Justiça, que, ao apreciar o Pedido de Tutela Provisória nº 2778 – RJ (2020/0139805-2), em 2020, validou um deságio de 60%.

No entanto, uma perspectiva favorável se apresenta para os trabalhadores que receberam apenas parte de seu crédito durante a recuperação judicial de seus empregadores.

Recentemente, julgados têm reconhecido que o credor trabalhista tem a possibilidade de buscar a satisfação total da dívida por meio da Justiça Trabalhista, direcionando a execução contra os devedores solidários e coobrigados, como os sócios e empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico, que não se sujeitaram à recuperação judicial do empregador.

A fundamentação utilizada pelos Magistrados encontra embasamento no artigo 275 do Código Civil, que prevê que os devedores solidários permanecem responsáveis pelo saldo residual do valor parcialmente pago, e 277, do mesmo diploma, que dispõe que “o pagamento parcial feito por um dos devedores e a remissão por ele obtida não aproveitam aos outros devedores, senão até à concorrência da quantia paga ou relevada”.

Nesse sentido, vale transcrever a ementa de dois recentes casos em que os Tribunais Regionais do Trabalho, de São Paulo e de Goiás, autorizaram a cobrança do saldo não recebido na recuperação judicial em face dos devedores solidários, ao dar provimento aos recursos dos empregados:

“GRUPO ECONÔMICO. SOLIDARIEDADE PASSIVA. PAGAMENTO PARCIAL NO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO TRABALHISTA PELO SALDO REMANESCENTE EM FACE DOS COOBRIGADOS SOLIDÁRIOS. In casu, houve celebração de acordo e pagamento parcial do trabalhador exequente, no juízo da recuperação judicial, por empresa integrante do grupo econômico da ex-empregadora. Agora, revela-se possível o prosseguimento da execução trabalhista em face dos demais coobrigados solidários. Isto porque o plano de recuperação judicial não afeta o direito do credor trabalhista em executar os devedores coobrigados do crédito exequendo. Não se aplica a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, ambos da Lei 11.101/2005. Agravo de petição do exequente provido.” (TRT-2 – AP: 0126200-17.2005.5.02.0060, Relatora: Bianca Bastos, 9ª Turma, Data de publicação: 18/04/2023)

“EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CRÉDITO PARCIALMENTE QUITADO NO JUÍZO UNIVERSAL. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. Não tendo o crédito trabalhista sido totalmente satisfeito no Juízo da Recuperação Judicial cabe o prosseguimento da execução para quitação do saldo remanescente inadimplido, em desfavor de empresas ou sócios que não participam da Recuperação Judicial e que são solidariamente responsáveis pelo pagamento do crédito exequendo, pois a novação da obrigação prevista no Plano de Recuperação se refere apenas às empresas que fazem parte da Recuperação Judicial, que são obrigadas ao cumprimento do plano, não atingindo empresas ou sócios não incluídos na Recuperação Judicial da devedora principal. Agravo de petição do exequente a que se dá provimento.” (TRT-18 – AP: 0010714-79.2016.5.18.0083, Relator: Elvecio Moura dos Santos, 3ª Turma, Data de publicação 26/04/2023)

Vale destacar ainda que o entendimento majoritário do Tribunal Superior do Trabalho é de que é possível o redirecionamento da execução ao patrimônio dos sócios ou dos integrantes do mesmo grupo econômico da empresa em recuperação judicial, sendo que, nesse caso, subsistirá a competência da Justiça do Trabalho para processar os atos executórios, à medida que eventual constrição não recaia sobre os bens da empresa recuperanda, o que atrairia a competência do Juízo Universal.

Portanto, os precedentes acima demonstram um entendimento favorável à proteção dos direitos dos trabalhadores, permitindo a continuidade da execução contra os devedores solidários, mesmo após o pagamento parcial do crédito trabalhista na RJ.

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