De dentro de casa: Justiça do Trabalho não é loteria e quem acioná-la pode, inclusive, sair no prejuízo

03/05/2023

Por Eduardo Galvão Rosado

Todo e qualquer trabalhador pode acionar a Justiça do Trabalho para discutir lesão ou ameaça de direito. Afinal de contas, o acesso à Justiça é direito consagrado na Constituição da República, por meio do princípio da inafastabilidade da jurisdição, insculpido no artigo 5º, inciso XXXV.

Mas isso não significa que o direito pode ser deturpado, como quando uma pessoa, ciente de que não faz jus a nenhum direito, resolve ingressar com a ação, onerando o Estado e a parte ex adversa.

Em casos assim, quem ingressa com ação na esperança de ganhar dinheiro pode acabar saindo no prejuízo, haja vista a possibilidade de improcedência da demanda, com o consequente pagamento de custas processuais e, ainda, honorários advocatícios de sucumbência – inovação trazida pela Lei 13.467/2017 –, caso reste indeferido, também, o pedido de concessão da justiça gratuita.

Recentemente, o Teixeira Fortes obteve êxito em uma ação trabalhista de vultoso valor, em que o trabalhador viu os seus pedidos serem julgados integralmente improcedentes, inclusive o de justiça gratuita, e, por consequência, foi condenado ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência nos percentuais de 2% e 5% sobre o valor da causa, respectivamente, gerando-lhe uma obrigação de aproximadamente R$ 97 mil.

No caso em debate, o trabalhador pleiteou o reconhecimento de vínculo empregatício em decorrência de dois contratos entabulados: o primeiro, de agência – firmado por uma pessoa jurídica -, e o segundo, de sócio quotista.

Todavia, conforme sustentado pelo Teixeira Fortes, não podia o autor da ação, com capacidade reconhecida no mercado financeiro e, inclusive, conhecedor da lei, alegar a sua própria torpeza para obter vantagem econômica.

Isso porque não se vislumbrou a ocorrência de nenhuma espécie de vício de consentimento apta a ensejar a nulidade dos contratos firmados por pessoas capazes que, de comum acordo, manifestaram suas vontades instituindo as modalidades contratuais – de prestação de serviços de natureza comercial/cível e societária – que pretendiam seguir, não sendo inferida, ainda, a presença dos elementos determinantes para caracterização do vínculo de emprego, a saber: subordinação, pessoalidade, não eventualidade e onerosidade (artigo 3º da CLT) [1] .

Nesse sentido foi a decisão proferida pela Magistrada de 1º grau:

Não se pode demonizar o mercado e as inúmeras modalidades de contratação existentes. As relações do mercado não se resumem ao contrato de emprego, como bem sabido. O autor não é um simples e humilde trabalhador que desconhece a realidade e que pode ser ludibriado por termos contratuais complexos, antes o contrário.

(…)

O autor não fez prova alguma de que tenha atuado como empregado enquanto prestador de serviços PJ e menos ainda quando aderiu como sócio à segunda reclamada. Não há prova de vínculo e nem de unicidade.

Logo, não comprovada qualquer nulidade nos termos do artigo 9º da CLT, restam mantidos os contratos (…).” (negrito nosso)

A aventura jurídica do trabalhador foi tamanha que, segundo a Magistrada, “ficou bem claro que havia um ‘combinado’” entre ele e sua testemunha que, no afã de beneficiá-lo, “mentiu sobre sua própria realidade e mentiu também, e exageradamente, sobre a suposta realidade do autor, porque foi muito além dos limites da lide e do depoimento do próprio reclamante”, não gozando o seu depoimento de qualquer valor probante e lhe sendo aplicada multa por litigância de má-fé no percentual correspondente a 2% sobre o valor da causa, bem como determinada a expedição de ofício ao Ministério Público Federal, para apuração do crime de falso testemunho, previsto no artigo 342 do Código Penal.

Assim, conclui-se que, a despeito do fenômeno chamado de “pejotização”, no caso defendido pelo Teixeira Fortes restou cabalmente comprovado que as partes entabularam contratos de natureza cível/comercial e societária e que não houve desvirtuamento das avenças. Com isso, a ação de mais de R$ 1,6 milhão foi julgada totalmente improcedente.

Antes do ingresso de qualquer demanda é preciso que os riscos sejam sopesados pois, do contrário, aquele que aciona a Justiça poderá acabar saindo no prejuízo, tal como aconteceu no caso aqui compartilhado, em que o autor da ação terá que desembolsar – se mantida a decisão – aproximadamente R$ 97 mil, enquanto sua testemunha, que mentiu descaradamente em Juízo, o valor aproximado de R$ 17 mil, além de responder por crime de falso testemunho.

 

[1] Em outra oportunidade, o sócio Eduardo Galvão Rosado esmiuçou os requisitos do vínculo de emprego, conforme o link que segue: https://www.fortes.adv.br/2018/05/24/de-dentro-de-casa-trabalhador-pj-pode-ter-vinculo-reconhecido/.

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