TJSP confirma fraude e mantém condenação por venda de imóvel entre irmãos

09/12/2025

Por Fernanda Allan Salgado

A 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar o recurso de Apelação nº 1004977-68.2023.8.26.0533, confirmou a existência de fraude contra credores na alienação de um imóvel realizada entre irmãos e manteve a condenação solidária de todos os envolvidos ao pagamento de perdas e danos.

O caso envolveu a venda de um imóvel de titularidade dos devedores a seus próprios parentes (irmãos), logo após o inadimplemento de uma cédula de crédito bancário e em um contexto de manifesta insolvência. Conforme destacou o Tribunal:

O estado manifesto de insolvência dos devedores é comprovado pela extensa lista de processos para resgate de dívidas vultosas, conforme bem apontado pela parte autora e pela total frustração das buscas empreendidas para localização de patrimônio passível de constrição, o que não é negado peremptoriamente pelos requeridos.
Outrossim, o crédito da parte autora era preexiste à alienação onerosa. […]

Além disso, a alienação ocorreu por valor muito inferior ao de mercado — quase dez vezes menor, em comparação a avaliação realizada por uma instituição financeira. Nas palavras do acórdão:

[…] no caso concreto, considerando que houve a transferência a preço inferior ao de mercado entre familiares e à luz da incontestável prova que aflora do próprio registro imobiliário, da certidão de valor venal 2020 e da escritura pública (págs. 43/48, 76 e 180/184), restaram demonstradas a anterioridade do crédito, o conluio presumido e a insolvência dos devedores ante as diversas execuções existentes contra eles, a ausência de bens penhoráveis em nome deles e o prejuízo ao banco credor, haja vista que a parte devedora não se desincumbiu de seu ônus de provar a solvência.

Outro aspecto decisivo foi o vínculo familiar entre alienantes e adquirentes. Para o TJSP, esse fator impede que o comprador alegue desconhecimento da situação financeira do vendedor: “o parentesco é condição que, de ordinário, impede a alegação de inocência do adquirente.

Acrescentou-se que os supostos compradores não apresentaram qualquer elemento que comprovasse boa-fé, como certidões negativas ou diligências prévias relativas à situação patrimonial dos vendedores.

Diante do cenário de conluio presumido, preço vil e prévia insolvência, o Tribunal de Justiça de São Paulo concluiu que estavam presentes os elementos para o deferimento da ação pauliana, citando inclusive doutrina de Nelson Nery Junior sobre a natureza objetiva da fraude contra credores: “não se exige a intenção de fraudar; basta que o negócio reduza o devedor à insolvência”.

Como o imóvel foi posteriormente transferido a terceiros de boa-fé, o Tribunal manteve a condenação dos envolvidos ao pagamento de R$ 275 mil, a título de perdas e danos, “[…] uma vez que a medida é razoável e espelha o histórico de transmissão do imóvel até os terceiros de boa-fé”.

A decisão reforça a importância da repressão a manobras patrimoniais que buscam blindar bens mediante negócios simulados entre familiares, reafirmando a proteção do crédito e a prevalência da boa-fé objetiva nas relações negociais.

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