A Busca e Apreensão Extrajudicial, segundo o Marco Legal das Garantias

26/01/2024

Por Marsella Medeiros Bernardes

Com a promulgação do Marco Legal das Garantias em 2023, o procedimento extrajudicial para consolidação e busca e apreensão de garantias fiduciárias – bens móveis –, regido pelo Decreto-Lei nº 911, de 1º de outubro de 1969, passou por alterações significativas.

Consolidação da propriedade. De acordo com o caput e §1º do novo art. 8º-B, a consolidação da propriedade fiduciária poderá ser realizada extrajudicialmente, mediante requerimento a ser apresentado diretamente ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos (“RTD”) do domicílio do devedor ou da localização do bem objeto do contrato:

“Art. 8º-B Desde que haja previsão expressa no contrato em cláusula em destaque e após comprovação da mora na forma do § 2º do art. 2º deste Decreto-Lei, é facultado ao credor promover a consolidação da propriedade perante o competente cartório de registro de títulos e documentos no lugar do procedimento judicial a que se referem os arts. 3º, 4º, 5º e 6º deste Decreto-Lei.

 

§ 1º É competente o cartório de registro de títulos e documentos do domicílio do devedor ou da localização do bem da celebração do contrato”.

O procedimento se iniciará com a notificação do devedor fiduciante para purgação da mora no prazo de 20 dias, que será providenciada pelo RTD, e realizada preferencialmente por meio eletrônico, conforme estabelecem os §§ 2º e 6º do Art. 8º-B:

“§ 2º Vencida e não paga a dívida, o oficial de registro de títulos e documentos, a requerimento do credor fiduciário acompanhado da comprovação da mora na forma do § 2º do art. 2º deste Decreto-Lei, notificará o devedor fiduciário para:

 

I – pagar voluntariamente a dívida no prazo de 20 (vinte) dias, sob pena de consolidação da propriedade;

 

II – apresentar, se for o caso, documentos comprobatórios de que a cobrança é total ou parcialmente indevida”.

 

“§ 6º A notificação, a cargo do oficial de registro de títulos e documentos, será feita preferencialmente por meio eletrônico, a ser enviada ao endereço eletrônico indicado em contrato pelo devedor fiduciário”.

Caso não haja confirmação de recebimento da notificação eletrônica em até 3 dias úteis, o RTD deverá providenciar o encaminhamento de notificação postal com aviso de recebimento, que poderá ser assinado por terceiros desde que enviada ao endereço indicado no contrato pelo devedor fiduciante, nos termos do §7º:

“§ 7º A ausência de confirmação do recebimento da notificação eletrônica em até 3 (três) dias úteis, contados do recebimento, implicará a realização da notificação postal, com aviso de recebimento, a cargo do oficial de registro de títulos e documentos, ao endereço indicado em contrato pelo devedor fiduciário, não exigido que a assinatura constante do aviso de recebimento seja a do próprio destinatário, desde que o endereço seja o indicado no cadastro”.

Persistindo a inadimplência, o oficial de registro de títulos e documentos averbará a consolidação da propriedade fiduciária, ou, em caso de bens registrados em outros órgãos – como, por exemplo, o Detran quando se tratar de alienação fiduciária de veículos –, comunicará para a devida averbação, o que poderá ser feito por meio de convênios das serventias, conforme previsão dos §§ 9º e 10 do art. 8-B:

“§ 9º Não paga a dívida, o oficial averbará a consolidação da propriedade fiduciária ou, no caso de bens cuja alienação fiduciária tenha sido registrada apenas em outro órgão, o oficial comunicará a este para a devida averbação.

 

§ 10. A comunicação de que trata o § 6º deste artigo deverá ocorrer conforme convênio das serventias, ainda que por meio de suas entidades representativas, com os competentes órgãos registrais”.

A obrigação de entrega do bem sob pena de multa. Diante da ausência de pagamento voluntário no prazo de 20 dias, o devedor fiduciante terá o dever de, no mesmo prazo e com a ciência do RTD, entregar ou disponibilizar a coisa ao credor para venda extrajudicial, sob pena de multa de 5% do valor da dívida, nos termos do § 11:

“§ 11 Na hipótese de não pagamento voluntário da dívida no prazo legal, é dever do devedor, no mesmo prazo e com a devida ciência do cartório de registro de títulos e documentos, entregar ou disponibilizar voluntariamente a coisa ao credor para a venda extrajudicial na forma do art. 8º-C deste Decreto-Lei, sob pena de sujeitar-se a multa de 5% (cinco por cento) do valor da dívida, respeitado o direito do devedor a recibo escrito por parte do credor”.

Caso o devedor fiduciante tenha disponibilizado o bem voluntariamente em vez de entregá-lo ao credor fiduciário, o valor total da dívida poderá incluir emolumentos, despesas postais e despesas com remoção da coisa, conforme previsão do § 12:

“§ 12. No valor total da dívida, poderão ser incluídos os valores dos emolumentos, das despesas postais e das despesas com remoção da coisa na hipótese de o devedor tê-la disponibilizado em vez de tê-la entregado voluntariamente”.

Nos termos do art. 8º-C, “consolidada a propriedade, o credor poderá vender o bem” na forma do art. 2º do Decreto-Lei nº 911.

Aqui, cabe uma ressalva: apesar de o texto legal falar em “poderá vender o bem”, não há dúvidas de que a venda deve ser realizada, sob pena de configuração do pacto comissório, vedado pelo art. 1.365 do Código Civil:

“Art. 1.365. É nula a cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada em garantia, se a dívida não for paga no vencimento”.

Busca e Apreensão Extrajudicial. Pois bem, feita a consolidação da propriedade, na hipótese de o bem não ter sido entregue ou disponibilizado voluntariamente no prazo legal, o credor fiduciário poderá requerer a busca e apreensão extrajudicial ao oficial de registro, apresentando o valor atualizado da dívida e a planilha com detalhamento da evolução da dívida, conforme previsão do §1º do art. 8º-C.

O oficial, ao receber o requerimento, adotará diversas providências, incluindo o lançamento de restrição de circulação e transferência de veículos no sistema, a comunicação aos órgãos registrais competentes e a expedição de certidão de busca e apreensão extrajudicial, conforme § 2º:

“§ 2º Recebido o requerimento, como forma de viabilizar a busca e apreensão extrajudicial, o oficial adotará as seguintes providências:

 

I – lançará, no caso de veículos, restrição de circulação e de transferência do bem no sistema de que trata o § 9º do art. 3º deste Decreto-Lei;

 

II – comunicará, se for o caso, aos órgãos registrais competentes para averbação da indisponibilidade do bem e da busca e apreensão extrajudicial;

 

III – lançará a busca e apreensão extrajudicial na plataforma eletrônica mantida pelos cartórios de registro de títulos e documentos por meio de suas entidades representativas, com base no art. 37 da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009; e

 

IV – expedirá certidão de busca e apreensão extrajudicial do bem”.

O credor, por si ou por terceiros mandatários, poderá realizar diligências para localização do bem objeto da busca e apreensão, na forma prevista nos §§ 4º e 5º do art. 8º-C:

“§ 4º O credor, por si ou por terceiros mandatários, poderá realizar diligências para a localização dos bens.

 

§ 5º Os terceiros mandatários de que trata o § 4º deste artigo poderão ser empresas especializadas na localização de bens”.

Apreendido o bem pelo oficial de registro e realizada a venda do bem pelo credor fiduciário, o RTD será comunicado da alienação, oportunidade em que (i) cancelará os lançamentos e comunicações feitas aos órgãos registrais competentes e (ii) averbará no registro pertinente ou, no caso de bens cuja alienação fiduciária tenha sido registrada apenas em outro órgão, comunicará a este para a devida averbação, nos termos do §7º do art. 8º-C.

De qualquer forma, é garantido ao devedor fiduciante, no prazo de 5 dias úteis após a apreensão do bem, o direito de pagar a integralidade da dívida pendente, com cancelamento da consolidação da propriedade e restituição da posse plena do bem, conforme previsão do § 9º do art. 8º-C:

“§ 9º No prazo de 5 (cinco) dias úteis após a apreensão do bem, o devedor fiduciante terá o direito de pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário no seu requerimento, hipótese na qual será cancelada a consolidação da propriedade e restituída a posse plena do bem”.

Expectativa. Essas mudanças geram a expectativa de simplificação dos procedimentos e de agilização da excussão das garantias fiduciárias (bens móveis). A flexibilidade concedida ao credor e a abrangência do processo contribuem para um ambiente de negócios mais eficiente e adaptável às particularidades de cada situação.

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