No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.980, o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu que o Fisco envie ao Ministério Público representação fiscal para apurar eventual cometimento de crime tributário pelo contribuinte, antes de uma decisão definitiva sobre a dívida tributária na fase administrativa.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) defendia nesse caso a inconstitucionalidade do artigo 83 da Lei nº 9.430/1996, cuja redação foi dada pela Lei 12.350/2010. De acordo com esse dispositivo, a Representação Fiscal para Fins Penais (RFFP) para apurar a prática de crime contra a ordem tributária (apropriação indébita, sonegação fiscal etc.), somente pode ser encaminhada ao Ministério Público após a decisão final na esfera administrativa.
Segundo a PGR, a regra que impõe ao Fisco a obrigação de aguardar o término da discussão administrativa estaria dificultando a apuração de atos criminosos na seara tributária, pois o contencioso administrativo fiscal, em regra, leva anos para entregar uma decisão final acerca do débito. Além disso, a PGR também defendia que não seria preciso aguardar a decisão final no processo administrativo porque a natureza formal dos crimes permitiria a acusação na esfera penal, independentemente da discussão sobre o débito.
A maioria dos Ministros, porém, discordou das alegações da PGR e acompanhou o voto do Relator, Ministro Nunes Marques, que considerou legítima a previsão contida no art. 83 da Lei nº 9.430/1996. Para o Relator, a norma que estabelece a necessidade de se aguardar o esgotamento do processo administrativo tem com pressuposto a noção de razoabilidade, pois não seria lógico admitir a responsabilização criminal do contribuinte por uma dívida tributária que ainda não está plenamente constituída.
O Relator ainda consignou que a regra que proíbe o procedimento criminal nesse caso não fere a constituição. Pelo contrário, enaltece o exercício da ampla defesa e do contraditório, na medida que impede o avanço de acusações criminais baseadas em questões ainda pendentes de decisão final na seara administrativa.
O resultado do julgamento é extremamente relevante para administradores de empresas que estão discutindo débitos tributários no âmbito administrativo, pois a Representação Fiscal para Fins Penais se tornou uma medida quase automática na cobrança dos débitos fiscais nos último anos. O Fisco percebeu que valia a pena se utilizar desse mecanismo para pressionar o contribuinte a realizar o pagamento do tributo, mesmo que o débito padecesse de alguma ilegalidade que fosse posteriormente reconhecida no julgamento administrativo.
Essa “pressão” feita pelo Fisco fez com que muitos contribuintes decidissem quitar o débito tributário, mesmo com o processo administrativo pendente de uma decisão final, em razão do temor de ser investigado ou acusado criminalmente pelo não pagamento do tributo, ou porque tal envolvimento num processo criminal poderia trazer diversos empecilhos na sua vida profissional (a exemplo dos controles de compliance).
Chega em boa hora, portanto, a decisão do STF reconhecendo a impossibilidade de o Fisco iniciar o procedimento para representação penal do contribuinte, sem que a discussão sobre o débito na fase administrativa tenha se esgotado. Qualquer entendimento contrário a esse colocaria em risco o direito à ampla defesa e ao contraditório, pois deixaria inúmeros contribuintes mais expostos ao risco de serem envolvidos numa investigação criminal, durante o curso do processo administrativo fiscal.
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