Alguns devedores de execuções civis são criativos e utilizam diversas medidas para blindagem patrimonial e frustração da execução. Nesse cenário, a efetividade da execução exige medidas direcionadas para localização de bens do devedor, com análise pormenorizada não apenas de seu patrimônio, mas também daqueles que o rodeiam.
Foi o que aconteceu em recente caso patrocinado pelo Teixeira Fortes. Em pesquisa aprofundada de patrimônio de uma devedora, o credor verificou que ela, já insolvente, de maneira absolutamente voltada a frustrar a execução, renunciou à herança milionária dos bens deixados pelo falecido pai.
A fraude foi denunciada ao Juízo de primeira instância, que entendeu que a matéria deveria ser discutida em processo autônomo e não no bojo da própria demanda executiva.
O credor recorreu e então o Tribunal de Justiça de São Paulo reformou a decisão e reconheceu que a renúncia à herança não pode prejudicar o credor, destacando que, embora válida perante terceiros, ela é ineficaz em relação ao credor e que a fraude deve ser reconhecida nos próprios autos da execução.
Como bem destacado no acórdão, “a declaração de ineficácia buscada pela agravante derivaria do eventual reconhecimento de fraude à execução, configurada, em tese, com a abdicação de bem e direitos oriundos da herança, pela executada, quando contra ela corria ação capaz de reduzi-la à insolvência (de execução), nos termos do art. 792, IV e § 1º, do CPC”. Ademais, conforme o acórdão, a medida independe de ação autônoma, de modo que a fraude deve ser analisada no próprio bojo da demanda executiva — e, por se tratar de renúncia e inventário extrajudiciais, o credor sequer detinha meios para intervir no inventário.
O Tribunal também destacou que “o ato jurídico não deixaria de existir, ser válido e eficaz para as partes que nele intervieram e terceiros de boa-fé, à exceção do exequente, para quem seria existente e válido, porém ineficaz”. Em outras palavras: o ato remanesce, mas não tem eficácia perante o credor, que poderá seguir com os atos de constrição sobre o patrimônio indevidamente renunciado.
A decisão é de suma relevância para a área de recuperação de ativos, pois demonstra que:
* o credor não precisa promover ação autônoma para contestar renúncias suspeitas — o tema deve ser resolvido na própria execução;
* renúncia, doação e outros atos gratuitos devem ser desconsiderados quando realizados para prejudicar credores;
* o Judiciário não tolera manobras ilícitas visando o esvaziamento patrimonial e o inadimplemento das obrigações contraídas, sobretudo quando praticadas por devedor já insolvente; e
* familiares beneficiados com a fraude também sofrerão a constrição dos bens indevidamente recebidos para blindagem patrimonial do devedor.
Em suma, renúncia, doação ou qualquer outra manobra destinada a blindar bens em benefício de familiares configuram fraude e serão desconsideradas para que o credor alcance o patrimônio indevidamente abdicado e satisfaça o seu crédito.
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