Alienação Fiduciária de Bens Móveis: a venda do bem retomado na busca e apreensão não depende do fim do processo

29/10/2025

Por Camilla Imthon Cavalcanti de Albuquerque

A forma processual de realização da garantia fiduciária de bens móveis — como veículos, máquinas, equipamentos industriais ou até obras de arte — é a ação de busca e apreensão, prevista no Decreto-Lei nº 911/1969. Por meio dessa via específica, o credor fiduciário, diante do inadimplemento do devedor, busca retomar a posse direta do bem objeto da garantia, passo indispensável para satisfazer o crédito e efetivar a finalidade econômica da alienação fiduciária.

Cumprida a liminar de busca e apreensão e decorrido o prazo legal de cinco dias sem que o devedor quite integralmente a dívida, a propriedade e a posse plena do bem se consolidam no patrimônio do credor fiduciário, nos termos do art. 3º, §§1º e 2º, do referido Decreto-Lei.

Surge, então, a dúvida prática: o credor deve aguardar a apresentação de defesa, o julgamento final e o trânsito em julgado da ação para poder dispor do bem? A resposta é negativa, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça. Após a consolidação da propriedade, não há qualquer impedimento legal para que o credor exerça integralmente seu direito de propriedade, inclusive alienando o bem a terceiros, ainda que o processo siga em curso e o devedor apresente defesa ou recursos.

No REsp nº 1.790.211/MS, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, o STJ já assentou que, decorrido o prazo legal sem a purgação da mora, a propriedade se consolida em nome do credor, que pode dela dispor livremente, sem violar o contraditório, a ampla defesa ou o devido processo legal. Isso porque, o próprio Decreto-Lei nº 911/1969, em seu art. 3º, §§6º e 7º, prevê mecanismo de recomposição patrimonial do devedor, impondo ao credor o pagamento de multa de 50% do valor originalmente financiado, acrescido de perdas e danos, caso a ação seja julgada improcedente. Assim, eventual reforma da decisão não implica prejuízo irreparável ao devedor, que possui expressa garantia legal de indenização.

A lógica do sistema é inequívoca: uma vez consolidada a propriedade, o bem integra o patrimônio do credor, não se justificando submetê-lo a restrições que a lei não impõe. A segurança jurídica do crédito fiduciário repousa justamente na possibilidade de rápida recuperação do valor investido, sem que o credor suporte o ônus da morosidade processual.

Esse entendimento tem grande relevância prática para o mercado de FIDCs e companhias securitizadoras, que frequentemente operam com créditos garantidos por alienação fiduciária de bens móveis. Após o ajuizamento da ação, a apreensão do bem e a consolidação da propriedade, o credor passa a suportar custos de guarda, manutenção e depreciação, o que torna inviável postergar a alienação até o trânsito em julgado.

Aguardar o desfecho definitivo do processo comprometeria a eficácia da realização das garantias, transferindo ao credor o ônus do inadimplemento e contrariando a finalidade do Decreto-Lei nº 911/1969, que é justamente assegurar celeridade e efetividade à recuperação do crédito.

Diante desse cenário, é essencial que o credor esteja bem assessorado juridicamente, a fim de adotar medidas imediatas caso alguma decisão judicial restrinja indevidamente a alienação do bem apreendido. Amparado pelo sólido precedente do STJ e pela clareza do Decreto-Lei nº 911/1969, o credor tem respaldo legal e jurisprudencial para exercer integralmente seus direitos de propriedade, inclusive o de vender o bem que já lhe pertence por força de lei (art. 3º, §1º, do Decreto-Lei nº 911/1969).

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