Recuperação de créditos e tecnologia: o caso do bloqueio no iFood

12/05/2025

Por Talita Medeiros Mesquita

A execução civil contemporânea exige cada vez mais criatividade e estratégia para enfrentar os desafios impostos por devedores que ocultam seu patrimônio. No campo da recuperação de crédito, a efetividade da execução está diretamente atrelada à capacidade do credor de identificar e alcançar ativos do devedor – o que muitas vezes esbarra na frustração de bloqueios bancários negativos e na limitação dos mecanismos tradicionais de constrição.

Nesse contexto, o uso de medidas executivas alternativas tem ganhado espaço e relevância. Recentemente, em processo patrocinado pelo Teixeira Fortes, foi deferido o bloqueio de recebíveis vinculado à plataforma iFood. O caso envolvia uma devedora sem bens localizáveis por meio dos sistemas tradicionais, mas com atuação ativa no ramo alimentício. Diligências extrajudiciais realizadas pela equipe revelaram que a empresa mantinha perfil ativo e operação diária pela plataforma de delivery. Diante desse cenário, foi pleiteada judicialmente a constrição de valores a receber diretamente do iFood.

Essa medida reflete a possibilidade de ampliar-se o alcance das execuções para além dos meios tradicionais, especialmente diante da digitalização das atividades empresariais. Além disso, esse tipo de constrição tem respaldo no artigo 835, XIII, do Código de Processo Civil, que prevê expressamente a penhora de “outros direitos” suscetíveis de avaliação pecuniária – o que inclui valores a receber por intermediação de plataformas digitais.

Por essa razão, a experiência do caso concreto reforça a importância da ampliação do repertório das medidas executivas, especialmente diante do comportamento recorrente de devedores que encerram suas atividades empresariais formalmente, ou mantêm seus bens fora do alcance dos sistemas judiciais, mas seguem operando ativamente no mercado, com fluxo de caixa constante.

Nesses casos, cercar o devedor com pedidos dirigidos a plataformas onde se concentra a atividade empresária, como fintechs e marketplaces, pode ser uma forma eficaz de alcançar quem tenta, artificialmente, aparentar insolvência, e desmascarar tentativas de fraude à execução.

A boa notícia é que a jurisprudência tem caminhado nesse mesmo sentido. Decisões recentes do Tribunal de Justiça de São Paulo, bem como de outros tribunais estaduais, têm reconhecido a legitimidade dessas constrições como meios adequados de efetivar o direito do credor, ao considerar que valores transacionados por plataformas digitais configuram receita e, portanto, patrimônio penhorável em nome do devedor.

Dessa forma, é evidente que a execução, em sua essência, é um instrumento de concretização do direito material. Por isso, deve ser flexível, adaptável e atenta à realidade econômica atual. Em tempos em que a tecnologia permeia praticamente todas as atividades comerciais, restringir a atuação do credor aos meios convencionais de penhora significa ignorar a dinâmica real das relações econômicas.

A decisão mencionada simboliza um avanço relevante: ela confirma que os meios alternativos de execução não só são legítimos como também eficazes – e devem ser cada vez mais explorados, sendo fundamental que o credor esteja adequadamente assistido para possibilitar a demonstração da ineficácia dos meios tradicionais e a constatação de indícios de que o devedor aufere receitas por meio dessas plataformas, entre outras.

Compartilhe

Vistos, etc.

Newsletter do
Teixeira Fortes Advogados

Vistos, etc.

O boletim Vistos, etc. publica os artigos práticos escritos pelos advogados do Teixeira Fortes em suas áreas de atuação. Se desejar recebê-lo, por favor cadastre-se aqui.