Juros nas execuções garantidas por depósito

23/11/2021

Por Maria Claudia Ribeiro Xavier

As execuções garantidas por depósito do devedor estão em debate no Superior Tribunal de Justiça. A Ministra Nancy Andrighi afetou o Recurso Especial n.° 1.820.963-SP para revisar o Tema 677 que, em 2014, firmou a seguinte tese por meio da sistemática dos Recursos Repetitivos: “Na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada.” [1]

O STJ determinou a suspensão, em todo o território nacional, dos recursos especiais e agravos em recurso especial envolvendo a mesma discussão do recurso afetado – se o depósito judicial no valor da obrigação libera o devedor do pagamento dos encargos de mora até o efetivo levantamento da quantia pelo credor.

Segurança jurídica e uniformização da jurisprudência motivaram a revisão do Tema 677

Os recursos julgados pela sistemática dos Recursos Repetitivos possuem a finalidade de firmar uma tese que será aplicada aos processos que discutam a mesma questão de direito. Segundo o STJ, o objetivo dessa sistemática é ‘concretizar os princípios da celeridade na tramitação de processos, da isonomia de tratamento às partes processuais e da segurança jurídica’. [2]

Foi visando a segurança jurídica e a uniformização da jurisprudência que a Ministra Nancy Andrighi propôs a revisão do Tema 677, após identificar divergência na aplicação da tese, nos casos em que o depósito judicial não implicou o imediato pagamento da obrigação, ou seja, o valor não foi levantado pelo credor.

Segundo a Ministra, quando firmada a tese do Tema 677, o foco foi a responsabilidade da instituição financeira pela remuneração da quantia depositada. Ela destacou que a Corte Especial do STJ não deliberou à época sobre os efeitos do depósito judicial em relação a mora do devedor, ‘isto é, não houve ponderação a respeito do efeito liberatório do devedor no tocante aos consectários de sua mora’.

A Ministra aponta que paralelamente ao Tema 677 – versando, frisa-se, sobre a extinção da obrigação do devedor nos limites do valor depositado judicialmente – consolidou-se no STJ o entendimento de que o depósito para garantia do juízo seria diferente de pagamento. O fundamento desse posicionamento seria o de que a satisfação da obrigação ocorre somente com a disponibilização do crédito ao credor.

Outra orientação relacionada ao Tema 677 foi firmada pelo STJ em 2016, no julgamento do REsp 1.475.859/RJ de relatoria do Ministro João Otávio de Noronha. A decisão se orientou no sentido de que o devedor não estaria liberado dos encargos da mora em decorrência da remuneração do depósito feita pela instituição financeira, pelo fato de o ordenamento jurídico brasileiro não reconhecer o depósito em garantia do juízo como modalidade de pagamento hábil a liberar o devedor, dando por satisfeita a obrigação.

O julgamento do recurso REsp 1.475.859/RJ resultou na orientação de que o devedor estaria sujeito aos encargos de mora até o efetivo levantamento da quantia depositada judicialmente pelo credor:

“o valor depositado judicialmente libera o devedor nos limites da quantia depositada, mas não o libera dos consectários próprios de sua obrigação, devendo-se, quando do efetivo pagamento ao credor, deduzir do montante calculado na forma do título judicial ou extrajudicial o valor depositado judicialmente e acrescido da correção monetária e juros pagos pela instituição financeira depositária”

Revisão do Tema 677 em sentido amplo

A proposta da Ministra Nancy Andrighi é a de que o Tema 677 seja revisto de forma ampla pela Corte Especial do STJ, para que se reafirme ou modifique sua tese, levando em consideração pontos que não foram ponderados à época da sua fixação, como a isenção do devedor pelos encargos de mora, em decorrência da remuneração do depósito judicial pela instituição financeira depositária.

O tema foi delimitado para revisão nos seguintes termos:

“[…] revisão da tese relativa ao Tema 677/STJ: definir se, na execução, o depósito judicial do valor da obrigação, com a consequente incidência de juros e correção monetária a cargo da instituição financeira depositária, isenta o devedor do pagamento dos encargos decorrentes da mora, previstos no título executivo judicial ou extrajudicial, independentemente da liberação da quantia ao credor”

Tema será revisto com a participação de amicus curiae

A FEBRABAN, entidade que representa as instituições bancárias, foi admitida no processo como amicus curiae. O seu argumento foi o de que a revisão do Tema 677 terá impacto sobre os bancos que, segundo a associação, são devedores, mas também credores de operações inadimplidas e que são cobradas judicialmente.

Ao admitir a entidade como “amiga da corte”, a Ministra Nancy Andrighi destacou que embora a matéria debatida no recurso afetado seja predominantemente processual, o ingresso de amicus curiae possibilitará ‘a ampliação do debate e, naturalmente, a legitimação democrática do entendimento a ser consolidado por esta Corte’.

A figura do amicus curie está prevista no artigo 138 do Código de Processo Civil [3] e o seu objetivo é o de colaborar com o Julgador, com o aprofundamento e ampliação do debate sobre determinada matéria, de modo que a decisão que resultar desse julgamento seja de tal modo qualificada, que atenda não apenas aos interesses das partes de um determinado processo, mas que possa ser aplicada a outros casos versando a mesma questão, isso em atenção ao princípio da segurança jurídica, que prima pela uniformidade e previsibilidade das decisões judiciais.

 

[1] https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&num_processo_classe=1348640

[2] https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Precedentes/informacoes-gerais/recursos-repetitivos

[3] Art. 138. O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação.

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