TJ autoriza penhora sobre comissão de corretagem

27/05/2021

Por Fernanda Allan Salgado

Em ação de execução movida em face de um empresário, após diversas medidas judiciais sem que a credora tivesse encontrado bens que garantissem a dívida, verificou-se em pesquisas extrajudiciais que o devedor era corretor de seguros patrimoniais e recebia importantes recursos em razão das apólices de seguro que negociava.

A empresa do devedor, uma corretora de seguros gerais, não compõe o polo passivo da ação, o que impedia que fosse realizada qualquer penhora de faturamento ou de seus ativos. Mas, considerando que a atividade de corretagem é exercida pessoalmente pelo sócio, e não pela pessoa jurídica, a fim de garantir a dívida, a credora solicitou a expedição de ofício à diversas seguradoras do País para que elas promovessem o bloqueio dos valores devidos ao executado em razão de suas atividades, até integral satisfação da ação de execução.

Entretanto, a credora teve seu pedido negado em primeira instância, isso é, pelo juiz do processo, por este entender que o valor recebido a título de corretagem se trata de verba salarial e, portanto, seria impenhorável.

Mas a decisão foi objeto de recurso ao Tribunal de Justiça, justificado pelo fato de que o montante não deve ser equiparado a salário, vez que decorre dos serviços realizados na atividade empresária do devedor, e mesmo que assim não fosse, o Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais de Justiça do País vêm possibilitando a flexibilização da impenhorabilidade dos proventos. O recurso foi acolhido pela Turma julgadora, que reformou a decisão proferida pelo juiz da 10ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros da Comarca de São Paulo/SP.

Os Desembargadores entenderam ser possível a penhora de percentual limitado a 30% do valor recebido pelo devedor a título de corretagem, pois não se tratar de verba salarial e não há vínculo empregatício do executado com as seguradoras. Vejamos alguns trechos da decisão:

“De início, registre-se o recente entendimento do C. STJ, a permitir a flexibilização da regra geral da impenhorabilidade, para admitir, excepcionalmente e conforme as peculiaridades do caso concreto, a penhora de até 30% (trinta por cento) das verbas de natureza alimentar recebidas pelo devedor (STJ, Corte Especial, EREsp 1.582.475-MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, maioria, j. 03.10.18).

Da interpretação conjunta dos artigos 798, inc. II, “c”, 829, § 2º, 835 e 847/848, todos do NCPC, conclui-se que a execução processa-se no interesse do credor, com vistas à maior efetividade da execução.

Dessa forma, considerando que a Agravante persegue o adimplemento de seu crédito, em tese, não há óbice ao requerimento de expedição de ofício à seguradoras a fim de verificar eventuais valores auferidos pelo Agravado a título de comissão como corretor de seguros.

Após a expedição do ofício, será, então aferida a viabilidade da penhora de percentual, este limitado a 30% (trinta por cento), do valor recebido pelo Agravado, ressalvando-se ao devedor a demonstração da impenhorabilidade do numerário antes de ser efetivada a penhora.”

Destaca-se que mesmo se a Turma não tivesse entendido que o montante recebido a título de corretagem pelo devedor não se trata de salário, a penhora parece-nos que seria admitida pela flexibilização da impenhorabilidade de salário, que vem ganhando cada vez mais força.

O Código de Processo Civil dispõe em seu artigo 833 diversos bens que são impenhoráveis para a garantia da satisfação de um processo de execução. Dentre eles estão os salários e remunerações (inciso IV) que só podem ser penhorados para o pagamento de prestação alimentícia ou quando a importância excede a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais.

Contudo, o Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais de Justiça do País vêm possibilitando a penhora do salário em situações excepcionais àquelas autorizadas pelo código processual.

Por exemplo, no acórdão do Recurso Especial nº 1.806.438/DF, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça admitiu a possibilidade de penhorar o salário de uma devedora, mesmo que inferior a 50 salários-mínimos, para arcar com o pagamento de honorários advocatícios. Em caso análogo, ao decidir os Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.518.169/DF, a Corte Especial do STJ entendeu que é possível penhorar salário do devedor, mesmo não se tratando de execução forçada de obrigação de pagar alimentos. Ou seja, em todos esses casos mitigou-se a impenhorabilidade do salário do devedor, mesmo que não se trate de obrigação de natureza alimentar.

De uma forma geral, a Corte Superior e o Tribunal de Justiça possuem precedentes que relativizam a impenhorabilidade do salário até o limite de 30%, fazendo uma ponderação entre a dignidade da pessoa humana e a efetividade da execução para pagamento da dívida.

Analisando as questões e decisões mencionadas acima, é possível concluir que mesmo diante da possibilidade de penhora de salário apenas nas situações excepcionais trazidas pelo CPC, se demonstrado que a penhora de uma porcentagem do valor recebido pelo devedor não influenciará na sua subsistência e de sua família, é possível o deferimento para que parte do valor auferido por ele responda pela dívida da ação de execução.

Além disso, o acórdão do TJSP deixa claro ser possível a penhora de montante recebido pelo devedor pela atividade empresarial que ele exerce, desde que demonstrado não haver vínculo empregatício do executado.

Veja aqui o acórdão na íntegra.

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